terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Porque eu votei contra a greve dos professores ou convidá-los a pensar


Salve salve pessoas... pois eis que o ano enfim começou. Segunda teve assembléia dos professores da rede pública do DF, da qual faço parte. A presença foi intensa e o clima era um só: GREVE. Os professores decidiram por uma paralisação até sexta, quando há nova assembléia marcada. Não há sinais que Sinpro ou governo vão ceder. Hoje a escola estava bem vazia, juntamos 2 turmas de 6o ano e duas de 9o com os presentes e avisamos: falem para vizinhos, colegas, amigos e parentes que tem aula no CEF 308 do Recanto das Emas.
Quando fiz a greve de 2012, que durou mais de 50 dias, fui o único professor da minha escola que parou a greve toda no turno matutino, sendo apenas dois na escola toda. Fiz questão de repor todas as aulas e montei um esquema para minimizar para os estudantes (que iam 1 sábado sim, dois não, por exemplo), mas não foi nem de longe o que era pra ter sido no ano regular. Daí que aprendi uma importante lição: eu não estou nessa pelo dinheiro. Eu não estou nessa pelos atrasados, pelos aumentos futuros ou pelos argumentos que mobilizem o sindicato a mobilizar a classe.
Eu estou nessa porque eu curto ser professor. Eu estou nessa pelos meus estudantes. Não vou prejudicá-los para receber. Pelo contrário... EU VOU PRA ESCOLA E VOU ENCHER A CABEÇA DA JUVENTUDE DE IDEIAS. Vou convidá-los a pensar. Vou provocá-los.
Vou mostrar pra eles as maquiagens dos discursos dos governantes, dos pais, da escola, dos professores, deles, dos meus. Vou falar sobre jogos de poder e sobre os donos do poder.
Que ninguém entenda que estou falando em missão... nunca! Professor é uma profissão como as outras... com deveres e direitos como todas as outras. 
Mas gostaria de ver as pessoas se indignarem que o piso nacional ainda seja um sonho em certos estados da federação. Gostaria que se pensasse que a nossa ilha de "caos no DF", bebe da eterna desolação de Maranhão e afins.
Eu já fiz greve achando que as pessoas queriam melhorar a educação.
Doce ilusão.
A greve é um instrumento político. Toda greve é política. Essa é política e partidária. 
Cada um tem seus motivos, sua indignação, suas esperanças.
Eu tenho minha experiência. Meus espaços de experiência e meus horizontes de expectativas pra citar o Koselleck... rs. Não é a GREVE, você que me lê. Não é o sindicato e não é o governo. É a sala de aula! Esse espaço que tentam enquadrar, mas que transborda os muros da escola quando se quer. Tudo o que eu falo é de querer... pros estudantes e pra você. 
É PRECISO QUERER.
Vai pra escola e dê uma aula como você nunca deu antes.
Aproveite a GREVE enquanto suspensão da normalidade e dê uma aula que você já vislumbrou, mas se proibiu.
Cante com eles.
Conheça-os a ti mesmo.
Navegue-os e se deixe navegar.
Assista Matrix com eles.
Fale de Deus ou do daime.
"Mas não diga que a vitória está perdida..."
Mas não ache que deixar a sala abalará o governo. O que abala o governo é estar nelas.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Plano de aula para o 9o ano: história, memória e cidadania


Salve salve pessoas, como eu disse na postagem anterior, esse ano são 9 turmas de 6o ano e uma novidade: vou dar aula para o 9o ano pela primeira vez. Os estudantes foram todos meus alunos no 6o e no 8o ano. Como normalmente trabalho com 8o ano, realizo a Olimpíada de História com os 9os anos para manter o contato. Essa experiência é uma das poucas práticas concretas com que contei para elaborar esse novo plano de aula, que ainda é muito teórico. Ano que vem eu vou ter um respaldado pela prática desse 2015 que vem por aí.
Meu planejamento está em concordância com a coleção de didáticos com que trabalho (que a escola recebe pelo triênio até o próximo PNLD), coleção História Temática da Conceição Cabrini e outros que uso e já citei aqui no blog. Hoje em dia, a coleção se chama Velear e falo sobre ela no meu texto sobre livros didáticos. De modo geral, os eixo-temáticos são cidadania e direitos humanos. Estes vem trabalhados em quatro unidades que percorrem tradicionais conteúdos do 9o ano, como as guerras mundiais e ditaduras no Brasil, mas também a industrialização brasileira no século XIX e a formação da cidadania na Grécia Antiga.
Eu acrescento dois outros eixos: história e memória. Além da cidadania, resolvi envolver também o tema da memória que esta relacionado à minha pesquisa de doutorado. Pesquisa que nasceu com o trabalho com estes estudantes (entre outros) no 6o ano e me fez pensar a proposta arrojada de integrar os educandos do 9o como orientadores para os estudantes do 6o ano, seja na recuperação colaborativa, seja na elaboração do teatro.
Bom, a ideia é começar com o mapeamento dos conceitos de história como todo ano e com as narrativas de história de vida. Depois serão apresentados os três eixos temáticos que caminharão em diálogo, mas terão direções próprias. A Olimpíada de História será preparada ao longo do 1o bimestre, tendo a culminância no início do 2o bimestre com as etapas. Minha melhor equipe até hoje foi até a 4a fase, mas com o trabalho específico com aulas para discutir as provas e fazer exercícios, vai ajudar bastante, então espero chegar até Campinas dessa vez.
O segundo eixo será mais de discussão sobre a formação da cidadania contemporânea ou pós-moderna, conforme queiram. Vou trabalhar com um recorte do Cidadania no Brasil: o Longo Caminho do José Murilo de Carvalho, a introdução. e História e Cidadania: Por Que Ensinar História Hoje? de Marcelo Magalhães, dois textos bons e que vão direto à questão dos processos de formação e afirmação dos direitos políticos, civis e sociais, além da questão do direito à diferença. A eles somam-se aulas expositivas sobre a atual "crise hídrica" e a 1a Guerra Mundial.
O terceiro eixo será o desenvolvimento do projeto História do Recanto das Emas. Assim como o trabalho da Olimpíada de História, esse projeto será em equipes de 3 pessoas. Ele consistirá em orientar os estudantes na escritura de uma história do Recanto das Emas a partir dos relatos de moradores, articulando-se essa prática ao que já é feito com os estudantes do 6o ano no 1o bimestre. A partir do 2o bimestre, após a Olimpíada, os estudantes trabalharão sobre o material produzido por seus colegas em consonância com minha pesquisa do doutorado.
Para todos os eixos existem aulas específicas, assim como aulas integradas que os articulam, assim como avaliações e recuperações continuadas. Também continuo utilizando muitos filmes, que transitam pelos três eixos. No 1o bimestre, por exemplo, irei fazer uso de Kill Bill 2, Cidade de Deus, Rap: o Canto da Ceilândia, Matrix, Glória Feita de Sangue e O Grande Ditador. Em todos os casos, são trechos do filme que permitem a discussão, ficando a critério do estudante ver o filme todo se tiver o interesse, assim como os textos escritos utilizados.
Continuando, se no 1o bimestre temos a preparação da Olimpíada, os conteúdos formação da cidadania e 1a Guerra, além da discussão do projeto História do Recanto. O 2o bimestre começa forte com as fases da Olimpíada até meados de maio. Depois disso passarei a alguns conteúdos para pensar a questão da cidadania e direitos humanos, que vão do período do fim da 1a Guerra até o fim da 2a Guerra: Revolução Russa, Guerra Civil Espanhola, totalitarismos, Crise de 29, Era Vargas, não necessariamente nessa mesma ordem. O projeto História do Recanto passará pela análise conjunta das fontes nesse período, produzidas pelos educandos do 6o ano no 1o bimestre, além da elaboração de um roteiro de pesquisa.
O texto que utilizo no 2o bimestre (além do livro didático) é A Revolução dos Bichos do George Orwell. Além deste, trabalho com os filmes Nós Que Aqui Estamos Por Vós Esperamos (completo), O Labirinto do Fauno, Terra e Liberdade e 1984.
O 3o bimestre se iniciará pelo projeto História do Recanto, onde após terem realizados entrevistas nas férias, os trios já estarão aptos a produzir algumas sínteses, que culminarão nos trabalhos finais em meados do bimestre. Antes disso, irei discutir a relação entre história e memória, discursos e regimes de verdade.
Caso haja alguma equipe classificada, na primeira semana de agosto estaremos indo para Campinas para a última etapa da Olimpíada.
A discussão sobre cidadania e direitos humanos se dará sobre temas como o pós-colonialismo, a ditadura militar no Brasil entre 1964 e 1985 e a comissão da verdade. Não haverá nenhum livro além do didático nesse bimestre, embora eu vá trabalhar textualmente a música Cálice de Chico Buarque e trechos de matérias de jornal sobre a comissão da verdade. Acrescento ainda os filmes Santo Forte, 15 Filhos, O Dia Que Durou 21 Anos e Entre os Muros da Escola.
A partir do 3o bimestre, eu também pretendo integrar os processos de recuperação continuada, utilizando os educandos do 9o ano como orientadores dos estudantes de 6o ano. Desse modo, cada equipe terá a responsabilidade de auxiliar alguns dos educandos menores, desenvolvendo sua própria capacidade de ensino e aprendizagem. Isso se integrará com o fato de que no 4o bimestre, já tendo dado conta da Olimpíada e do projeto História do Recanto, os grupos cuidarão de assessorar a realização do teatro da Guerra de Tróia, enquanto o estudo do mundo grego e a cidadania na Atenas de Péricles.
Sendo assim, o quarto bimestre terá a discussão de dois belos textos: a tragédia As Troianas de Eurípedes e O Elogio de Helena de Górgias.  Tais textos serão tomados como elementos para pensar esse modelo de cidadania construído a partir da Atenas de Péricles, assim como de seus mais famosos filósofos. Isso servirá para problematizar o modelo de cidadania moderno, bem como refletir sobre as possibilidades contemporâneas da cidadania com duas palestras do TED: O perigo de Uma História Única de Chimamanda Adiche e A Guerra Contra as Drogas de Ethan Nadelmann. Haverão também músicas e filmes com a culminância da apresentação de projetos de intervenção no Recanto das Emas a partir do CEF 308. As músicas que serão analisadas são Meu Amigo Pedro de Raul Seixas e Mistério do Planeta dos Novos Baianos e o filme é Tróia.
 O teatro (ou rpg) do mito é o grande evento do ano. Os estudantes ficam realmente alucinados, já me esperando com tudo pronto pra ação começar. Mas ano passado deu um trabalho descomunal, sendo assim, os estudantes do 9o ano atuarão como contra-regras e coordenadores das cenas (como aconteceu no ano passado, mas extra-oficialmente). Os educandos do 8o e 9o ano sempre tem um saudosismo de seus papéis e conseguem lidar melhor com os papéis.
As provas de todos os bimestres, como acontecia com os 8os anos, serão com consulta livre e os pontos serão distribuídos entre os 3 eixos de acordo com seu peso naquele bimestre. Vamos ver o que dá certo e o que eu mudo ano que vem...

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Plano de aula para o 6o ano: tempos, mitos e culturas (2015)


Salve salve pessoas, após muitas viagens e mudanças de rotas eis que chegam os novos planos para 2015. Este ano eu ia estar de licença remunerada para o doutorado e ficaria fora de sala pelos próximos 3 anos. Eu já poderia estar de licença desde o começo do ano passado, mas quis conciliar o primeiro ano (a licença está garantida no meu plano de carreira aqui do DF, mediante um seleção que precisa ser publicada em edital). E o que aconteceu? Com o desmantelo do governo passado, não saiu edital no fim de 2014 e com "a crise" no início de 2015, não creio que vá sair no meio do ano. Assim sendo, lá vamos nós, que a Ana, minha primeira filha, nasce em maio e aí será filha, trabalho, doutorado e viver... mas só fica mais difícil, não é mesmo?
Nesse ano terei 9 turmas de 6o ano, o que pra mim é uma alegria sem igual e facilita meu trabalho. Modéstia à parte, sou um sensacional professor de 6o ano e curto muito os seres humanos nessa faixa etária de fim da infância. Também terei pela primeira vez uma turma de 9o ano, do que falarei na próxima postagem. Meus eixos temáticos pro 6o ano são tempos, mitos e culturas. O texto aqui é muito parecido com os que publiquei nos últimos anos, mas com acréscimos, correções e mudanças. Essas temáticas seguem a proposta da coleção História Temática da Conceição Cabrini e outros que uso e já citei aqui no blog. Hoje em dia, a coleção se chama Velear e falo sobre ela no meu texto sobre livros didáticos.
Eu adoro dar aula pro 6o ano, me preparei muito bem pra isso durante um bom tempo, sendo um dos recortes da minha dissertação de mestrado. Além disso, já são 5 anos de experiência (10 turmas de 6o ano em 2010, 10 turmas em 2011, 7 turmas em 2012, 6 turmas em 2013 e 7 turmas em 2014). Os motivos de minha predileção são muitos: é o primeiro momento em que os educandos tem contato com um professor formado em história; marca a passagem dos anos iniciais pros finais do ensino fundamental, com mais disciplinas, professores, obrigações; tem início a consolidação de conceitos científicos dos educandos, em articulação com suas concepções espontâneas (na ótica de Vygotski); até mesmo a chamada pré-adolescência desse fim de infância é interessante.
A ideia de concepções espontâneas é meu ponta pé inicial. Normalmente, todos os livros didáticos de história iniciam suas coleções de história dos anos finais do ensino fundamental com um capítulo ou com uma apresentação sobre o que é história, alguns conceitos operacionais como tempo, sociedade, cultura e logo passa para o que denominam de "pré-história". Existem dois graves problemas aqui. O primeiro é apartar conceitos e conteúdo, isolando os primeiros como ferramentas ideais para o desenvolvimento do conteúdo, ou seja, realça-se o conteudismo em detrimento do desenvolvimento teórico e crítico dos educandos.
Os conceitos devem ser operacionalizados no trato com os conteúdos na minha opinião. Você pode discutir a história como discurso, como prática, como operação, como lente, como sentido ou qualquer outro regime que lhe interessar. Pensar o que é a história, o que é tempo deve ser encarado como pensar o que é contar uma história, fazer uma história, manipular uma história, dessecar uma história, acreditar em quantas histórias se queira.
Não se costuma ensina a pensar historicamente.. se ensina uma certa história. Um desdobramento disso é a ilusão de não se estar afirmando um modelo de história nesses conteúdos ensinados, como se o conteúdo tivesse um valor intrínseco, essencial e inescapável. Enquanto isso, esse modelo é afirmado e reafirmado por esse silêncio teórico-metodológico.
O segundo problema é deixar de lado, ignorar ou até mesmo atropelar as concepções espontâneas que os estudantes já trazem consigo de uma longa vivência pré-6o ano. Não só a escola já vinha envolvendo-os em um entendimento social e pedagógico de tempo, como as incontáveis experiências para além dos muros da escola também já deixaram suas marcas em seus horizontes de expectativa. Viver e pensar a história chega muitos antes da disciplina história e de seus disciplinadores.
É importante dialogar sobre os fundamentos teóricos e metodológicos da história com os educandos, assim como valorizar o espaço de suas experiências na construção de possíveis entendimentos da historiografia. Para isso, desenvolvo meu trabalho do 1o bimestre todo concentrado na discussão de o que é história. Eu inicio com a discussão do conceito que os estudantes tem de história, apresento o conceito de alguns dicionários sobre o que é história e finalmente o meu próprio entendimento. Esse debate integra-se às noções de biografia e autobiografias, onde os educandos são instigados a pensarem suas próprias histórias de vida e de outras pessoas.
Mesmo que os estudantes cheguem depois, faltem as aulas, esse primeiro passo é essencial para mim. Ele fundamenta todo o resto e faz com que não haja a opção de discutir a concepção do educando, pensar sua biografia e suas relações sociais, familiares e escolares.
Pretendo inaugurar uma nova dinâmica avaliativa através da leitura de artigos relacionados aos temas tratados e desenvolvidos (como, por exemplo, uma biografia de Cândido Portinari e de Izabel da Cunha, contidas no livro didático, a minha própria e a deles mesmos). É uma  constante avaliação e construção de saberes, pode ser uma recuperação continuada articulável com outras disciplinas, muito embora, meu real interesse seja pluralizar as possibilidades de discussão.
Em conjunto com o debate sobre documentos históricos, a relação entre a pesquisa e a narração sobre o passado, o trabalho bimestral dos estudantes é escrever a biografia de seus avós. Para tanto, eles devem realizar entrevistas de acordo com um roteiro previamente tratado em sala. Posteriormente, os trabalhos são corrigidos e discutidos com todo o grupo, de modo que cada turma produz uma síntese das informações baseada nos dados coletados de cada turma e do conjunto das turmas. Assim, além de se articular a experiência pessoal e familiar dos estudantes, constrói-se uma leitura da história local, uma representação da comunidade da qual eles fazem parte. Ao longo desses 5 anos em que desenvolvo esse trabalho, isso me permitiu articular histórias de vida com a história do Recanto das Emas (região administrativa onde trabalho), partindo num segundo momento para a história de Brasília (o que culmina com a data do aniversário de Brasília no final do 1o bimestre e início do 2o bimestre). Ao invés de fazer dos educandos os receptáculos pretensamente vazios de um saber pronto conhecido por mim, minha proposta é construir com eles uma história deles mesmos, de suas famílias, de sua cidade.
Este ano, haverá um momento adicional, pois irei envolver os educandos do 9o ano. Pretendo que eles formem grupos, que lerão, corrigirão alguns trabalhos e elaborarão um texto sobre sua pesquisa (tudo acompanhado por mim).
Nenhum estudante conclui o ano comigo sem fazer esse trabalho. Minha cobrança faz com que até 80% realizem até o prazo inicial, mais 15% até o fim do bimestre. Mesmo que o educanda chegue no meio do ano, ou seja evasivo à máxima potência, em último caso, eu sento ele na biblioteca e fazemos o trabalho. Lembre que o objetivo não é puni-lo por não fazer, o objetivo é fazer (e querer fazer). Nos últimos três anos, esse trabalho também foi reapresentado e retrabalhado para feira de ciências do 3o bimestre, articulado com as biografias produzidas pelos estudantes nas aula de português. 
Esse projeto além de me trazer enorme satisfação também é utilizado por mim como pesquisa para o doutorado. Meu projeto de pesquisa foi aprovado no fim de 2012 no programa de pós-graduação da UnB, muito embora tenha ganhado uma orientação de história urbana do Recanto das Emas, buscando outras interlocuções além da memória dos estudantes e moradores. Ainda assim, é uma pesquisa sobre ensino de história, sobre minha prática e sobre essa comunidade da qual tomo parte.
Integrada a essa síntese, é desenvolvida a discussão das percepções do tempo, os instrumentos culturais para marcar a passagem do tempo, os ciclos e as linearidades, o tempo histórico, tradição e ruptura. Atentando para a diversidade das culturas em seus entendimentos e expressões do tempo, entender o nosso tempo e o tempo do outro. Há uma visita ao planetário de Brasília, que foi reformado. Não é possível levar todos os alunos do 6o ano, o planetário poderia oferecer um acerco e videos melhores, mas ainda assim o passeio é válido.
No 2o bimestre, articulado com os conceitos tratados desde o começo do ano, nós passamos para a discussão sobre a formação do universo, dos astros e, principalmente, da vida. Debatendo as próprias ideias de evolução, criação, origem, os alunos são instigados a pensar sobre as convergências e divergências, heranças e perdas do que entendemos por ser humano. Rompendo com uma noção de "pré-história", esse período histórico é abordado como teatro do que vemos como fundamental em nossa sociedade: o trabalho, a propriedade, o artesanato, a agricultura, o comércio, a metalurgia, a escrita.
O trabalho bimestral é realizado em grupo, com várias matérias jornalísticas sobre ancestrais do homo sapiens sapiens, expressando uma diversidade de opiniões, conceitos, leituras, entendimentos e definições do processo evolutivo do chamado homem moderno.
Além disso, acrescento o material da minha viagem à África do Sul ano passado, região onde estão vários dos mais antigos fósseis humanos, além dos lêmures de Madagascar. Pude fotografar o famoso australopithecus sediba, descoberto em 2009, além de ficar impressionado com o museu de história natural da Cidade do Cabo. Como sempre faço, a ideia é integrar o mundo lá fora à sala de aula, Viajar é preciso, meus caros.
No 3o bimestre, eu passo a tratar de 4 civilizações antigas, mas não em concordância com a visão
tradicional da evolução etapista da formação da sociedade ocidental. Eu trabalho com a Mesopotâmia, o Egito Antigo, a Índia Antiga e a China Antiga através de um mito de cada povo. A ideia é construir nossa própria leitura desses povos, enquanto formas culturais diversas de desenvolvimento humano na margem de grandes rios como Tigres e Eufrates, Nilo, Indo e Amarelo. Não se trata de encontrar uma pretensa totalidade politico-econômica-sócio-cultural em lenta formação.
O trabalho para avaliação consiste em que cada estudante crie um povo e um mito. Através de alguns modos de operação como divisão social, rio, divindades, ele deve trabalhar com os conceitos apresentados anteriormente. A criatividade é incentivada. Como é um trabalho mais complexo e feito em casa, o índice de realização chega a 65% na data marcada e 90% até o fim do bimestre.
No 4o bimestre, dou continuidade ao trabalho com mitos e civilizações. Através do mito da Guerra de Tróia (Ilíada de Homero), não só podemos construir uma leitura da civilização grega, como explorar a importância desse mito e da cultura grega para nosso tempo. Cada estudante fica responsável por um personagem do mito, que ele interpreta durante o estudo do mito. O teatro (or rpg) do mito é o grande evento do ano. Os estudantes ficam realmente alucinados, já me esperando com tudo pronto pra ação começar. Valorizam ao máximo seus papéis. A grande apresentação coletiva ao fim do ano letivo foi um sucesso. Ainda que não tenhamos chegado a apresentar para a escola, como planejado inicialmente, os ensaios foram o máximo, com envolvimento de alguns educandos do 8o e 9o ano, que sempre tem um saudosismo de seus papéis. Houve a criação de uniformes e até mesmo de réplicas de armas e capacetes. Tudo isso pode ser visto nos vídeos em anexo.
Além disso, ao fim das encenações, cabe a eles contarem o que aconteceu com o personagem depois da guerra (quem disse que a morte é um fim?), cada um tendo sua própria Odisseia.
Por fim, fechamos os trabalhos com a Eneida de Virgílio e a valorização da cultura grega no mundo romano.
Dá trabalho, mas modéstia a parte, é muito bom... e está sempre sendo melhorado.